Massimo Ferrari e o Frango na TV

17:17

Por Paulo Pedroso

Se alguém lhe convidar para degustar um frango de “televisão de cachorro” do Massimo, não duvide, é vero! E acredite, não foi o Massimo que baixou o nível, e sim o frango que galgou alguns degraus na escala de valores gastronômicos. E por fim, esse novo fidalgo alimentício, que recebe até massagem de ervas antes de entrar na TV, só vai se transferir para a mesa da sua casa se você não se arrepiar com o preço.


Depois de quase dois anos de ausência, o Piemontês de sorriso largo Massimo Ferrari reapareceu no cenário gastronômico da cidade com uma rotisseria com o singelo nome de Felice & Maria, uma homenagem a seus pais. As constantes desavenças com o único irmão e sócio Venâncio, fizeram com que ele se afastasse da lendária casa na Alameda Santos que leva seu nome, e que foi um símbolo da alta gastronomia nas décadas de 80 e 90. Eu me lembro de ter jantado no Massimo há quase trinta anos com meu pai e de ter ficado impressionado com a figura grandalhona e onipresente dele circulando apressado pelo salão e conversando com os clientes. Mais tarde, soube que pelas suas mesas passaram grandes figuras da política brasileira que se revezavam entre o Piantella em Brasília, que sediava a velha turma do “Poire” comandada por Ulisses Guimarães, e o Massimo em São Paulo, onde importantes decisões que afetaram a vida nacional foram tomadas entre garfadas de spaguetti al cartoccio e taças de Barolo. É de conhecimento público que em 2006 a candidatura de Geraldo Alckmin para concorrer à Presidência da República foi decidida num famoso jantar entre os caciques do PSDB no Massimo.


Massimo Ferrari chegou ao Brasil aos 5 anos de idade com sua família, e na década de 50 seus pais abriram o restaurante Cabana no centro de São Paulo, que logo se tornou um endereço elegante na cidade Duas décadas depois, em 1976, os irmão Massimo e Venâncio, seguiram a trilha do pai e partiram para um empreendimento próprio; o restaurante Massimo. Desde o início a casa primou por manter um certo espírito aristocrático do Norte da Itália, oferecer cozinha clássica italiana e cobrar preços de gente grande, ou seja, muito altos. Ninguém reclamou do valor da conta, pelo contrario, ao longo de mais de duas décadas a casa acumulou uma clientela seleta e fiel que ajudou a transformar o local num ícone da alta gastronomia, colecionando prêmios e condecorações. Infelizmente o seu Felice não viveu para ver o sucesso dos filhos.


Respeito à tradição

A figura de Massimo ficou de tal forma identificada com o seu restaurante que quem entra na sua rotisseria pode sentir saudades do seu antigo endereço na alameda Santos. Não há diferença, ele mesmo diz que é tudo à la carte, só que agora ele serve na casa do cliente. O espaço, que fica na Vila Olímpia, zona sul de São Paulo, está à altura do seu nome. Tem 500 metros quadrados, estacionamento próprio e uma equipe de funcionários extremamente gentis e impecavelmente vestidos. Na chegada, ele recebe a todos do mesmo jeito com seu sorriso e seus indefectíveis suspensórios e apresenta os pratos exuberantes que desfilam sobre os balcões aos finais de semana, sempre temperando a conversa com expressões típicamente italianas como Mamma mia, Ciao e Grazie a Dio. Logo de cara podemos notar que não são apenas seus pais que são homenageados na casa, mas toda a tradição italiana da boa mesa e da simplicidade.

Do lado esquerdo há uma espécie de afresco com a imagem de uma pequena Vila, como é costume nas pequenas cidades da Itália, onde eles homenageiam os artesãos da cidade . Em frente, ainda na entrada, vemos uma boneca em tamanho real e em movimento, de uma senhora cozinhando, uma verdadeira Nona que faz menção à cozinha caseira, aquela que passa de geração a geração, chamada pelos italianos de “cucina casalinga”. No salão principal, aos finais de semana, os pratos ficam expostos sobre os balcões. São porchettas, aquelas leitoinhas desossadas, picanhas, aves, pernas de cordeiros e a famosa lazanha Ferrarese. Mas cuidado, se você entrar no Felice & Maria provavelmente vai sair carregando alguma coisa, pois suas atitudes passarão a ser comandadas pelos aromas inebriantes que dominam o ambiente. Na hora de levar a compra pra casa, esqueça aquelas quentinhas da rotisseria na esquina da sua casa. Lá, a sua comida sai num pirex embalado em caixas de papelão e chega no seu carro pelas mãos dos garçons impecavelmente vestidos. No comando da cozinha está o Chef toscano Sergio Lorenzi, que garante a qualidade e a variedade das receitas. Além de oferecer seus pratos nessa verdadeira galeria das tentações, Massimo também leva sua grife para jantares, festas e eventos.

Andiamo avanti!

Seguindo pela loja, nos deparamos com um balcão de pães. São as famosas focaccias, todas preparadas seguindo a receita original em vários formatos e recheios como alice e pomodoro. Do outro lado, numa cozinha envidraçada um funcionário prepara massas à vista dos clientes num utensílio curioso chamado Guitarra, que tem esse nome porque a massa é esticada sobre umas cordas de aço com um rolo e depois de cortada é preciso dedilhar as cordas para poder soltá-la. Na sua frente vemos uma vitrine com as jóias da casa. Massimo apresenta suas massas expostas uma a uma sobre uma base de veludo negro e com uma iluminação especial que fazem os papardeles, spaguettis e fetuccines parecerem peças da Tifanny. É um luxo que simboliza a importância que ele dá a cada detalhe.


Por fim, chegamos à praça dos doces e tortas que completam o banquete. São aquelas sobremesas irresistíveis capazes de adiar qualquer pretensão de dieta para a famosa segunda-feira. São as tradicionais Pastiera di grano e tarte tatin, entre outras delícias.  O que não podia faltar está no subsolo. É uma adega com centenas de rótulos que Massimo pretende transformar em enoteca no futuro. Um local para  degustações, jantares para pequenos grupos e encontro de confrarias. O toque exótico da nova casa está no final do corredor, onde se depara com um gigantesco leão esculpido em madeira, e que, segundo o restaurateur simboliza uma espécie de proteção.

Grand Finale

Embora continue sócio do restaurante que leva seu nome, Massimo hoje dedica-se quase que exclusivamente aos acepipes do Felice e Maria, não indo ao antigo negócio há mais de dois anos. Ele diz que leva uma vida ascética e sua dedicação à gastronomia é total. Perguntei se ele freqüenta algum restaurante e ele disse que não, que sua vida é só trabalhar. A única confissão que ele me fez foi que mantém uma vasta coleção com centenas de suspensórios, inclusive no segundo dia em que estive com ele, ostentava um modelo psicodélico, segundo sua própria avaliação. Além de atender na rotisseria e comandar jantares para festas e recepções, ele ainda toca o restaurante da diretoria da Rede Globo em São Paulo. É remotíssima a possibilidade de que ele possa abrir um novo restaurante. Massimo pretende continuar só com a rotisseria, mas seu sonho mesmo é fundar uma escola, um centro de gastronomia para passar toda a sua experiência para as novas gerações. Não resta dúvida de que será um grande desafio para ele criar um empreendimento que siga em frente sem a sua forte personalidade sempre presente. Massimo não esconde o seu estilo centralizador, porém demonstra ao mesmo tempo ser uma pessoa afetuosa e apaixonada, que gosta de ressaltar a importância de se olhar para o passado num mundo onde só se fala em modernidade. Auguri Massimo! Buona Fortuna! Paulo Pedroso Revista SAX 2012

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