Le Marais

09:42


Por Paulo Pedroso (2011)

Com pouco menos de dois anos de existência, o Le Marais Bistrot já se impõe entre os grandes restaurantes franceses de São Paulo. A empresária Ida Frank, conhecida pelo sucesso da sua parceria com Paulo Barroso de Barros no premiado Due Cuochi, criou uma casa sofisticada, porém manteve-se fiel ao verdadeiro espírito dos bistrots franceses. Mas, afinal, o que quer dizer bistrot? A origem do vocábulo está associada a uma história no mínimo curiosa. Segundo alguns historiadores, uma das versões data do início do século 19, quando a França foi derrotada pelos russos. Consta que os soldados que ocuparam Paris chegavam famintos às pensões e, para apressar o serviço, gritavam “bistrô” (быстро, em cirílico), que na língua de Tolstói quer dizer rápido ou depressa. O que pode ter  sugerido a ideia de um lugar informal onde se servem refeições simples e rápidas. Porém, ao longo de quase dois séculos, independentemente da origem do nome, o bistrot se tornou uma verdadeira instituição francesa e a idéia que se tem desse tipo de casa evoluiu até chegar no conceito de um lugar pequeno e simples, porém aconchegante, que coloca a convivência e a relação entre as pessoas no mesmo grau de importância da comida. Segundo a tradição, o próprio dono é quem recebe os clientes, o que lhe confere uma atmosfera caseira e familiar. Ida apostou nessa fórmula e criou, junto com seu sócio e chef responsável pela cozinha Wagner Resende, uma casa que, apesar da sofisticação do ambiente, mantém um atendimento bastante caloroso. 

 A atmosfera clássica do Le Marais é perceptível desde a entrada em art déco, bem ao estilo dos antigos bistrots de Saint Germain des Prés, em Paris, até as tradicionais “banquettes” junto a um grande espelho no salão. O vitral no teto, os quadros com fotos em preto e branco de Marcio Scavone nas paredes e um bar classudo completam a atmosfera requintada da casa. “Comme il faut”, reconheceriam os franceses. A cozinha é de uma simplicidade surpreendente, a começar pelos pães do couvert que são fabricados lá mesmo. Não raro os clientes pedem para levá-los para casa. O chef e sócio Wagner Resende é um dos segredos do sucesso da casa. Ele trabalhou por quase dez anos com o francês Erick Jacquin no La Brasserie, depois passou um periodo no finado Lucca até chegar ao Due Cuochi, onde permaneceu por um breve tempo, até a inauguração do Le Marais. Wagner absorveu o melhor de cada lugar por onde passou. Executa sem medo e com maestria todos os clássicos de bistrot franceses. De moules et frites e rãs à provençal até pratos mais ao gosto dos franceses como moelas, passando pelo cassoulet, o foie gras, o confit de pato e as terrines. Além disso, apresenta algumas criações mais modernas incorporando espumas e emulsões. À medida que se mergulha nos pratos, percebe-se as camadas sutis de complexidade de temperos e aromas que ressaltam a qualidade dos ingredientes. A apresentação é limpa, porém não com aquela aparência asséptica que se vê hoje em alguns restaurantes ditos contemporâneos. Outra prova de que Wagner está ocupando um espaço importante na cena gastronômica paulistana foi a famosa troca de paneladas verbais com o seu ex-patrão Jacquin, que o acusou de “roubar” seus melhores funcionários. O barraco foi parar na mídia, que não se furtou a expor o lado competitivo e pouco glamouroso da profissão.


Uma das prováveis razões dessa briga pode ter sido a vinda da patissière Amanda Lopes para o Le Marais em setembro do ano passado. Amanda não é uma patissière qualquer, fato que justifica uma disputa pelo seu passe. Na França, ela estudou em nada menos do que na famosa escola Lenôtre e no Instituto Paul Bocuse. Além disso, estagiou na pâtisserie de Pierre Hermé. No Brasil, trabalhou por vários anos com o francês Fabrice Lenud, uma autoridade no assunto, e depois foi chef  patissier e responsável por toda a confeitaria do restaurante La Brasserie, onde teve uma sobremesa premiada como a melhor da cidade. No Le Marais, ela renovou recentemente o cardápio de sobremesas e introduziu versões pessoais de clássicos como o mil-folhas e o cheesecake, entre outros. Atualmente, todas as sobremesas de sonhos da casa são de sua autoria, inclusive os espetaculares macarons.

A freqüência do Le Marais é composta por uma turma que já passou dos trinta anos e mantém sempre aquela aparência cool de quem acabou de sair do banho seja qual for a hora do dia. No almoço, marcam ponto executivos de ternos bem cortados e grupos de mulheres que se encontram para colocar a conversa em dia e confraternizar com um bom champagne. Já à noite, a presença de famosos gourmets que chegam para o jantar são a prova de que a cozinha de Wagner Resende não está para brincadeira. Muitos deles levam líquidos raros para acompanhar o repasto. Eu mesmo presenciei sobre as mesas o desfile de Château Cheval Blanc de 3 litros, Château Latour Magnum e Mouton Rothschild. Apesar disso, o serviço do restaurante é desprovido de afetação, traço comum em restaurantes finos de São Paulo. Os garçons são atenciosos, porém sem exagero, e o chef Wagner gosta de circular entre as mesas e está sempre disposto a aceitar sugestões dos clientes, explicar receitas com reconhecida generosidade.


Trilha sonora de grife

Um dos gourmets bastante conhecidos das grandes mesas e taças do eixo São Paulo-Rio de Janeiro é o músico e enófilo Ed Motta, que além de freqüentador assíduo do Le Marais, se tornou amigo de Wagner e Ida. Ed colocou o seu vasto conhecimento musical a serviço da casa e criou as trilhas sonoras do restaurante. Esse é um detalhe aparentemente sem importância, mas faz enorme diferença. A seleção musical de Ed Motta é fruto de um conhecimento não só da música, mas do efeito que ela causa. No almoço, por exemplo, Ed escolheu músicas mais quentes e solares que evoquem a atmosfera da Côte d’Azur. Já à noite a musica vem em camadas de estilo de acordo com o horário, que culminam com o lendário Serge Gainsbourg adoçando a alma dos mais boêmios. Ao todo, são oito horas de raridades que não passam da década de 70, executadas por artistas franceses e músicos cuja trajetória tenha a ver com a França, não importa que sejam americanos, argentinos e até brasileiros, como Victor Assis Brasil.




Próxima parada, St Honoré

Neste mês de junho, a novidade é a abertura do St Honoré a poucos metros do Le Marais. A casa é um misto de boulangerie, pâtisserie e bistrot com serviço de café da manhã, almoço e jantar, com o trio Ida, Wagner e Amanda à frente. A casa segue os moldes do Lenôtre de Paris, com pães incríveis e patisseria de alto nível. Além disso, o cliente pode levar para casa clássicos da cozinha francesa como uma terrine de pato ou coelho, um foie gras, um confit de pato embalado a vácuo, além de queijos, massas e vinhos. Depois do sucesso do Due Cuochi, e da tacada certeira do Le Marais, pode-se imaginar que o St Honoré seguirá os mesmos padrões de qualidade, num negócio cada vez mais competitivo e de risco elevado, que é o mercado de restaurantes de luxo em São Paulo.


Por fim, se a conta no Le Marais passar um pouquinho das suas expectativas, lembre que você está economizando uma passagem aérea para jantar em Paris e fazendo uma refeição num digno representante da tradição gastronômica francesa no coração de São Paulo. E se caso quando você estiver jantando tocar uma música de Boris Vian na trilha sonora de Ed Motta, não se preocupe e cante junto com ele, “Je suis snob” e bon appétit!


"Bistrot não é negócio"
Por Edgard Reymann

Glamour é algo que se adquire com o tempo, é cultivado ao longo da vida e, com o tempo, acaba se refletindo no modo de ser da pessoa. O bistrot é um restaurante glamouroso por excelência, pois, além de ser aconchegante, seu sucesso está intimamente ligado à presença do dono. No Le Marais, a “alma e o glamour” da casa têm nome e sobrenome: Ida Frank. De ascendência suiça e baiana, ela viveu a vida toda entre o Velho e o Novo Mundo. No Brasil, foi socióloga de prestígio, vereadora em 1982 pelo PMDB e presidente do Conselho Estadual dos Direitos da Mulher em São Paulo. Na França,viveu por doze anos, e até hoje mantém um pequeno imóvel no tradicional Marais, bairro localizado entre o terceiro e o quarto arrondissements de Paris.

Desde menina, no entanto, costumava brincar de cozinhar: “Tinha um fogãozinho que ficava ao lado da casinha de bonecas”, relembra. Esse rosebud pessoal foi reabilitado quando ela fundou o Maria’s Bistrot, que depois foi transformado num dos melhores restaurantes de São Paulo, o Due Cuochi Cucina, em sociedade com o chef Paulo Barroso de Barros.


Em 2009, fundou, junto com o chef Wagner Resende, o Le Marais, um dos mais charmosos bistrots da cidade. Para Ida, o segredo do bistrot é o seu caráter familiar. “Bistrot não é negócio, como um restaurante feito para ganhar dinheiro. Os donos do bistrot precisam estar presentes em tudo, decidindo sobre as compras, o preparo da comida e ainda cuidando da decoração e do relacionamento com o cliente”, avalia a empresária que fez muitos amigos dentro do bistrot. “É uma intimidade que não pode ser grande demais, inclusive”, recomenda. Para ela, o convívio dos sócios no negócio é fundamental: “Eu, o Wagner e a Amanda passamos a maior parte de nosso tempo aqui. Conversamos muito e acabamos criando uma intimidade particular, que se reflete na casa" define.
 
Serviço


Le Marais Bistrot
R. Jerônimo da Veiga, 30 - Itaim Bibi

São Paulo (11) 3071-2873

St Honoré
R. Pais de Araújo 185 – Itaim Bibi

São Paulo (11) 3071-2932
 

Abçs
Paulo

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